terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Povo dá adeus a Silvestre Botão, o "órgão" cultural dos bois de São Luís e Ribamar



O ex-vereador e marchante de São José de Ribamar, Silvestre Batista Botão, pai de 63 filhos, entrou, ontem, para a cultura da tradição oral do Maranhão: falecido na manhã de sábado passado, aos 70 anos, no Hospital do Ipem, vítima de um diabetes que lhe ocasionou a falência múltipla dos órgãos, mereceu dos seus conterrâneos, em sua residência, um dos mais concorridos velórios dos últimos tempos, e de participantes, em seu sepultamento, no cemitério municipal.


Assim que a família noticiou o seu passamento, começaram as centenas de visitas à sua casa, na Rua da Liberdade, 597, desde a manhã de anteontem, numa "sentinela" prestigiada por seus ex-colegas de parlamento, como o vereador ex-vice prefeito Antônio Augusto, ex-vereador Mazinho, e o ex-vereador e secretário municipal da Cultura, João Damásio Pinheiro, o Garrafinha, vereador Artuzinho, e a lembrança de passagens interessantes que fizeram de Silvestre Botão, quanto ele ficou mais conhecido, na política e na cultura popular, uma figura pública elogiada, por suas ações de solidariedade, e criticada, por rompantes intransigentes. Os prós pesaram mais que os contra, na conta de uma pessoa mão-aberta em auxílio aos mais necessitados que lhes chegasse aos ouvidos e ele pudesse ajudar, inclusive, financeiramente, e a inclinação para fortalecer a cultura popular, principalmente, a dos bumba-bois de matraca, havendo ele nascido no povoado Cururuca, em Paço do Lumiar, berço de um dos "batalhões pesados": o de Iguaíba.


Como seria esperado, entre uma multidão que levou o caixão de Silvestre Botão ao cemitério, na Av. Gonçalves Dias (Rua Grande), estavam dirigentes e brincantes de bois de matraca, como os cantadores João Chiador (do Outeiro-Ribamar) e Ivan Miranda (Boi do Cu-Pelado). Na frente do cortejo fúnebre, vizinhos, parentes e amigos de longas datas proporcionaram uma das mais emocionantes homenagens prestadas a um dos mais importantes colaboradores da comunidade e dos grupos folclóricos juninos maranhenses, nos últimos 30 anos. "Foi um dos maiores ajudantes dos nossos bois, e mais depois que foi vereador do município"!- lembrou João Chiador, 73 anos, tirado por Silvestre do Boi da Maioba para o de Ribamar, em 1991, numa transação que rendeu durante anos muitos comentários e rusgas com a rapaziada maiobeira, que ascendeu Chagas seu principal cantador e com sucesso imediato.


Canetada na Câmara - Após o enterro do corpo do reverenciado, bastante aplaudido por pessoas de todos os segmentos sociais, não faltaram na Praça Nicolau Sodré, a popular Praça da Tesoura, reminiscências sobre a personalidade marcante de Silvestre Botão. Dentre elas, o episódio de quando foi vereador e viu que não havia caneta na casa, e por isso não titubeou na compra imediata de caixa do material para a devida distribuição aos seus colegas e aos funcionários. "Ele era assim mesmo, irredutível, certas horas, e bom de coração, tanto que adiamos de hoje à tarde para o próximo domingo o jogo de futebol que programamos entre os times amadores Gonçalves Dias e Guarany"! - revelou Jose Ribamar Dias Filho, o popular Mijão, cartola do Gonçalves Dias, que paga as cerveja s para si e os atletas, após o compromisso, com seu time perdendo, ou ganhando, o jogo.
Carregador do Lava-Bois - Quando em 1989, sentindo que fraquejava o Lava-Bois, encontro dos batalhões de matraca, no primeiro domingo de julho, em Ribamar, Silvestre Botão nem pestanejou: criou um arraial defronte da sua casa e contratou todos os cordões, pagando a chamada do seu próprio bolso depois de cada apresentação. Brincavam ali os Bois da Madre de Deus, Ribamar, Maracanã, Matinha, Iguaíba, Juçatuba, Pindoba, Maioba, Sítio do Apicum, etc.


Foi assim durante alguns anos consecutivos, já que a Municipalidade não incentivava "o capim" dos bois, às voltas com muitas despesas para a locomoção, e Silvestre, quando menos, estimulava o evento, pagando as exibições. Quando os bumba saíam do seu arraial, no amanhecer de domingo, e iam medir forças no Lava-Bois, na Rua Grande, ele andava atrás deles, na manhã toda, distribuindo bebidas para os brincantes. Falo de cadeira, pois a meu pedido, inclusive, Silvestre bancou a Morte do Boi da Madre Deus, em termos de carne de boi e mocotó, num tempo difícil, no começo da década de 1990, em que o secular touro não tinha apoio cultural e político.


Filhos aos Botões - Entre os 63 filhos reconhecidos por Silvestre Botão, estão: José Acrísio, Ana Cláudia, Érica, Luís Augusto (Luisinho), Luciana, Raimunda Rosa, Taiane, Maria Livramento, Silvestre Filho I, Silvano, Renata, Marcelo Renato, Silverli, Silvestre Júnior, Samires Carolina, Rubens, Denise, Daniele, Diego, Silvestre Filho II, Joelma, Gabriela, etc. Os mais velhos são com D. Lucimar Reis Botão: Maria Raimunda Reis Botão (Cajuíta), de 50 anos, Luís Augusto (Luisinho (, 48, José Acrísio, 47, Raimunda Batista (Miruca), 45, Maria Livramento, 43, e Silvestre Filho, 40 .


Valemos o que temos!" --Silvestre Botão foi vereador de São José de Ribamar, em duas legislaturas consecutivas: de 1989 a 1996. A perda da eleição para o terceiro mandato, coincidia com a sua decadência nos negócios, porém sempre prestigiando as brincadeiras de bumba-boi, que não corresponderam mais à altura. Uma semana antes do seu falecimento, , ele desabafou a falta de prestígio e reconhecimento à sua comadre de alma vizinha Maria José Protázio Alves (batizou um filho desta com sua segunda mulher, a professora Maria do Socorro Ferreira): "Comadre Maria, nós valemos o que temos"!


Essa sentença de Silvestre Botão foi facilmente percebida por mim, quando muitos cantadores e dirigentes do folclore boieiro não foram ao seu adeus, como os populares que sequer foram beneficiados, de alguma forma, por ele. Eu saio dessa lista, pois sempre, em seu tempos das vacas magras, levei o agradecido Boi da Madre de Deus para vadiar de graça na porta da casa dele, já mais humilde. Como lembrou o cantador Ivan Miranda, antes de seu sepultamento: "Ele fez muito tempo por esta terra, para não ser esquecido tão cedo como homem público"! Ou como seu filho, Silvano, de 35 anos: "Ele fez boas coisas para o povo, e está aqui agora, e por muito tempo, para ser ou não reconhecido!"

Herbert de Jesus Santos
(Especial para o Jornal Pequeno)